Sucessão familiar: atenção às mudanças do ITCMD com a Reforma Tributária.

Artigo elaborado por Diego Viscardi, advogado especialista em Direito Societário.

Quando do falecimento de uma pessoa, todo seu acervo patrimonial, sejam, imóveis rurais e urbanos, carros, motos, ações, quotas, dentre outros será transferido para seus herdeiros e/ou cônjuge sobrevivente. Havendo falecimento a herança será de obrigatoriamente transferida aos destinatários, mediante processo de inventário. Diante disso surge como opção de transmissão aos herdeiros, mecanismos sucessórios em vida, que permitem, ao titular do patrimônio, antes do falecimento transferir tais ativos de modo organizado, equilibrado e, muitas das vezes com uma eficácia tributária em comparação com o processo de inventário. Podemos citar como exemplos de estruturas em vida: as doações com reserva de usufruto, constituições de holdings familiares, testamentos, planos de previdência, fundos de investimentos, dentre outros.

Entretanto, em ambos os casos, seja no inventário, seja na transmissão em vida, essa transição patrimonial terá a incidência do ITCMD – Imposto Causa Mortis e Doação, tributo esse de competência estadual que passou por relevante mudança diante da aprovação da Reforma Tributária – PEC 45/2019, alterando principalmente (i) a previsão de alíquotas progressivas; e (ii) o ajuste e avaliação da base de cálculo. Tais alterações, salientamos que poderão ocasionar majoração do valor a ser recolhido na transmissão patrimonial aos herdeiros.

PRINCIPAIS ALTERAÇÕES DO ITCMD COM A REFORMA TRIBUTÁRIA

A) ALÍQUOTAS PROGRESSIVAS

Atualmente, por meio Resolução do Senado Federal nº 9 de 05/05/1992 os estados podem estimar alíquotas de 1% a 8% referente a tal tributo. Com a Reforma Tributária esses patamares não foram alterados, todavia, a PEC 45/2019 trouxe a obrigação dos estados estipularem a progressividade das alíquotas, ou seja, os estados que possuem alíquotas fixas, terão que alterar suas legislações para cumprimento dessa regra. Podemos citar como exemplos de estados que ainda cobram alíquotas fixas, o estado de São Paulo (4%), Mato Grosso do Sul (doação 3%, falecimento 6%), Paraná (4%), Minas Gerais (5%). Ou seja, certamente para esses estados o ITCMD, apesar da progressividade, a tendência que maiores patrimônios terão uma tributação elevada para o teto permitido, tendo como alíquota aplicada na transmissão dos bens aos herdeiros o percentual de 8%.

B) REVISÕES DA BASE DE CÁLCULO DE QUOTAS E/OU AÇÕES SOCIAIS

Atualmente a maioria das legislações estaduais regulam que a base de cálculo para doações ou falecimento de quotas sociais (LTDA) ou ações de sociedades anônimas (S/A fechadas) é o valor patrimonial da quota ou ação. Em termos resumidos, valor patrimonial de uma quota ou ação é a divisão do patrimônio líquido da empresa pelo número de quotas ou ações existentes, em outras palavras, sempre será considerado o patrimônio líquido da sociedade na data da doação ou falecimento, sendo em alguns estados, como por exemplo, no estado de São Paulo, o patrimônio líquido contábil, mesmo que seja um valor defasado.

Ocorre que, com a Reforma Tributária, essa base de cálculo será calculada de outra forma, sendo que a nova legislação trouxe inclusive critérios que deverão ser observados para valoração das quotas ou ações.

A nova legislação prevê que a base de cálculo do ITCMD devido na transmissão de quotas ou ações deverá ser apurada mediante a aplicação de metodologia tecnicamente idônea e adequada às quotas ou ações, inclusive de método técnico que contemple eventual perspectiva de geração de caixa do empreendimento (e.g., fluxo de caixa descontado). Assim, o valor da base de cálculo deve corresponder, no mínimo, ao patrimônio líquido ajustado pela avaliação de ativos e passivos a valor de mercado. Outro ponto de atenção que afetará diretamente as holdings familiares titulares de imóveis (holdings patrimoniais, imobiliárias), é que diferentemente do que atualmente é regulado (valor do patrimônio líquido contábil), os imóveis que a holding possui deverão ser avaliados a valor de mercado. Ou seja, tais mudanças aumentarão de forma significativa a base de cálculo, e consequentemente o valor final do tributo.

Abaixo uma simulação para uma holding situada no estado de São Paulo, com comparações dos cenários.

Doação de Quotas ou Ações
Cenário AtualCenário Reforma Tributária
AtivosValor PL ContábilValor PL ajustado a Mercado
Imóvel 1R$ 350.000,00 R$ 1.500.000,00
Imóvel 2R$ 100.000,00 R$ 2.000.000,00
Imóvel 3R$ 50.000,00 R$ 1.200.000,00
Imóvel 4R$ 600.000,00 R$ 5.000.000,00
Imóvel 5R$ 1.500.000,00 R$ 10.000.000,00
Lucros AcumuladosR$ 5.000.000,00 R$ 5.000.000,00
Total PL R$ 7.600.000,00 R$ 24.700.000,00
Alíquota ITCMD4%4%
Valor Tributo R$ 304.000,00 R$ 988.000,00

Observem que o simples fato da nova legislação permitir a atualização dos imóveis para valor de mercado ocasiona, por óbvio, a majoração da base e um acréscimo relevante do custo final da transmissão do patrimônio aos herdeiros.

Fato é que, diante dessas novas regras de ITCMD sobre herança e doações poderá levar muitas famílias a uma dificuldade gravíssima no momento do pagamento do imposto, mormente para patrimônios que possuem baixa liquidez. Especialmente no tocante a transmissão de imóveis e participações societárias, a situação se agrava. Tendo em vista que esses bens não possuem liquidez financeira imediata, pode ocorrer, geralmente, tentativas de venda de algum imóvel para pagamento do tributo ou mesmo um pedido de apuração dos haveres em caso de sociedades.  Sendo assim, a família poderá passar por um complexo processo de sucessão, sendo que muitas vezes o período discorrido para a regularização ocasionará perda de valor no tocante aos imóveis e redução da disponibilidade financeira (caixa) na empresa, tendo em vista a necessidade do pagamento de haveres do sócio falecido.

O planejamento sucessório estruturado neste momento permite aproveitar as alíquotas atuais e favoráveis do ITCMD, sendo um antídoto face a esse potencial aumento. Essas alterações já foram aprovadas, podendo passar a vigorar, em regra, a partir de Janeiro/2026. Desta forma, a janela para aproveitamento dos valores contábeis para transmissão do patrimônio aos herdeiros está se encerrando, sendo urgente a necessidade do estudo de alternativas eficazes para transmissão do patrimônio.

Além de preparar a transmissão do patrimônio diminuindo os eventuais conflitos entre herdeiros, a organização do patrimônio pode ser uma saída preventiva contra esse anunciado aumento do ITCMD, visto a existência do binômio “possibilidade/necessidade”.

Em conclusão, planejar a sucessão é a melhor maneira de aumentar as chances de perenidade e longevidade de uma empresa e de um patrimônio, propiciando as futuras gerações da família conforto e segurança, tanto financeira, como juridicamente, permitindo ainda um estudo prévio que poderá ocasionar uma redução dos custos tributários e os desgastes que o processo de inventário causaria ao grupo familiar.

Para maiores informações acerca do tema, o Parluto Advogados, através de equipe especializada, está à disposição para esclarecimentos

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